Após receber o diagnóstico de Transtorno de Espectro Autista (TEA) para o filho, os pais iniciam uma árdua jornada na busca por maior conhecimento, adaptações e o tão importante tratamento para garantir a qualidade de vida da criança.
É nesse cenário que autismo e plano de saúde se cruzam, afinal, é de se esperar que o convênio médico privado possa suprir parte das necessidades desse paciente recém diagnosticado.
Contudo, alguns questionamentos podem ocorrer, como por exemplo: o tratamento é ou não é previsto pelo rol da ANS? Deve haver limitação no número de sessões de terapia? Quando há o direito ao reembolso de despesas médicas?
São inúmeras perguntas sem respostas que não facilitam em nada o processo de transformação que essa família está passando, o que acaba prejudicando a saúde e o desenvolvimento da criança autista.
É por esse motivo que hoje estamos aqui para ajudar você, genitor (a), no entendimento dos direitos relacionados ao plano de saúde para o beneficiário atípico.
Acompanhe o conteúdo até o final!
O que é o Transtorno de Espectro Autista – TEA?
Segundo a Organização Pan-Americana de Saúde, o Transtorno de Espectro Autista é uma série de condições caracterizadas por algum grau de comprometimento no comportamento social, na comunicação e na linguagem, e por uma gama estreita de interesses e atividades que são únicas para o indivíduo e realizadas de forma repetitiva.
Distúrbio do neurodesenvolvimento, o autismo começa na infância e tende a persistir na adolescência e na idade adulta. As condições começam a ficar aparentes logo nos primeiros anos de vida.
Estima-se que 1 em cada 160 crianças nasce com o espectro austista.
Autismo e plano de saúde
Diante das limitações do Sistema Único de Saúde (que inclui filas de espera para atendimento e falta de profissionais especializados), a rede de saúde privada, por meio dos convênios médicos, acaba sendo a opção mais viável para o tratamento do autista.
Entre os procedimentos indicados pelo médico que acompanha a criança, estão as terapias multidisciplinares com múltiplos profissionais: fonoaudiólogos, pedagogos, psicólogos e fisioterapeutas.
Além disso, um outro tratamento bastante indicado é o método ABA, que trabalha o estímulo à aprendizagem e demais habilidades consideradas essenciais para uma melhor qualidade de vida.
Como podemos ver, o acompanhamento de especialistas é altamente necessário para esse tipo de paciente, sem falar dos medicamentos que podem ser receitados a depender do caso.
As operadoras de saúde têm o dever de disponibilizar o tratamento, como veremos mais adiante, só que na prática não é sempre que isso acontece.
Se os procedimentos já inclusos no Rol da ANS frequentemente são negados pelas operadoras, o que esperar dos demais que ainda não constam na lista e que são indicados pelo médico assistente, como no caso da equoterapia e musicoterapia?
Em algumas situações, a operadora chega a disponibilizar o tratamento, mas limitando o número de sessões das terapias, o que não faz sentido já que a criança precisa se desenvolver continuamente.
São por esses motivos que autismo e plano de saúde parecem ser duas coisas opostas, o que gera imenso transtorno aos pais.
Mas isso não precisa ser assim, daí a importância de conhecer os seus direitos!
O plano de saúde cobre tratamento para autismo?
Sim, e essa afirmação pode ser feita com base na Lei 9.656/98, conhecida como a Lei dos Planos de Saúde.
De acordo com o texto, as operadoras de saúde devem fazer a cobertura obrigatória para doenças e transtornos listados na CID-11 (Classificação Internacional de Doenças). Todos os diagnósticos do espectro autista estão reunidos no código 6A02.
Portanto, ao solicitar uma autorização para o tratamento, lembre-se de mencionar os termos da lei.
Se o plano de saúde negar o tratamento para o seu filho, estará descumprindo a principal legislação que é a base para sua regulação.
O que a legislação diz sobre o autismo e plano de saúde
A garantia mais recente de tratamento de autismo pelo plano de saúde, partiu da ANS no dia 23 de junho de 2022 por meio da Resolução Normativa nº 539, quando tornou obrigatória a cobertura de qualquer método ou terapia indicada para o tratamento de Transtornos Globais do Desenvolvimento, entre os quais estão o Transtorno do Espectro Autista, a Síndrome de Asperger e a Síndrome de Rett.
Antes disso, em dezembro de 2012 foi criada a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Lei 12.764/12).
Entre as previsões deste texto, está a determinação de que pessoas com TEA têm os mesmos direitos que já são previstos por lei para grupos de indivíduos com deficiência.
No que se refere à planos de saúde, a lei define que é obrigatória a cobertura de atendimentos multiprofissionais para pacientes que sejam diagnosticados com autismo.
Já na relação empresa x consumidor, temos o artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor, que é amplamente utilizado nos tribunais para análises de ações judiciais contra planos de saúde. Veja abaixo:
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
I – impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos.
Inclusive, o Tribunal de Justiça de São Paulo (que julga grande parte das ações contra planos de saúde do país) redigiu as Súmulas 96 e 102:
Súmula 96: “Havendo expressa indicação médica de exames associados a enfermidade coberta pelo contrato, não prevalece a negativa de cobertura do procedimento.”
Súmula 102: “Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS.”
Como conseguir cobertura para o tratamento do autismo pelo plano de saúde?
Para que um tratamento seja autorizado pelo plano de saúde, a indicação deve partir do médico assistente do paciente, após a conclusão de laudos e relatórios que indiquem a necessidade do procedimento.
Com o pedido em mãos, o titular do plano ou o seu responsável deverá fazer contato com a operadora de saúde para solicitar a liberação do tratamento.
Importante: o médico deve descrever detalhadamente no pedido tudo que será realizado, como número de sessões, especialistas que estarão envolvidos, etc.
Direito ao reembolso de despesas médicas com o tratamento do autismo
O reembolso de plano de saúde para as despesas médicas do paciente autista, geralmente está previsto nas seguinte situações:
- por indisponibilidade de profissionais especializados dentro da rede credenciada;
- na hipótese de recusa de atendimento pelo plano de saúde;
- em casos de urgência ou emergência.
Para pedir o reembolso, os pais devem documentar todos os tratamentos e despesas relacionados ao tratamento do autismo.
Se a operadora negar o pedido de reembolso, saiba que é possível recorrer contra a negativa.
Dica: antes de buscar uma rede particular para seguir com o tratamento, verifique se no contrato de adesão existe a cláusula de reembolso para honorários médicos e despesas hospitalares.
Principais problemas relacionados ao autismo e plano de saúde
Confira abaixo algumas situações ilegais que geralmente estão relacionadas ao autismo e plano de saúde. Lembre-se que todas são práticas indevidas que podem ser contestadas!
- Dificuldade na contratação
Ter um filho no espectro autista não impede que os pais façam a contratação de um plano de saúde. Com base na Lei 9.656/98, todos os cidadãos têm direito a contratar um convênio médico.
Com a criança autista a única diferenciação seria o cumprimento da carência de 24 meses em razão da doença preexistente, ou seja: a condição diagnosticada antes da contratação do plano.
- Negativa de tratamento
Conforme já falamos, alguns tratamentos podem ser negados pelo plano de saúde, sob a justificativa de não estarem previstos no rol da ANS e até mesmo os que já estão!
Contudo, a Justiça costuma seguir o entendimento de que é o médico que deve escolher o tratamento adequado ao seu paciente, não cabendo à operadora tal função.
- Negativa de medicamentos
Medicamentos podem ser indicados pelo médico assistente para melhorar a socialização e qualidade de vida do autista.
Alguns podem ser de alto custo, o que faz com que as operadoras não queiram custeá-los.
- Limitação no número de sessões de terapia
A prática é considerada indevida desde julho de 2022, quando a ANS divulgou a Resolução Normativa nº 541 que aprovou o fim da limitação no número de sessões com psicólogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais e fisioterapeutas.
A decisão passou a valer a partir de 01/08/2022.
Como contestar uma prática indevida do plano de saúde?
Se o plano de saúde estiver agindo com ilegalidade perante seus beneficiários, saiba que um dos seus direitos é contestá-lo. Neste caso, indicamos o seguinte passo a passo:
1- Fazer contato com a operadora pela ouvidoria, relatar o caso e aguardar um devolutiva;
2- Se a posição da operadora se mantiver, é possível abrir uma reclamação diretamente na ANS;
3- Além disso, o paciente também pode abrir reclamações no Procon e no Consumidor.gov.
Caso nenhuma dessas alternativas sejam suficientes, o mais indicado é fazer contato com um advogado especialista e verificar a viabilidade de uma ação judicial contra o plano de saúde.
Precisa de auxílio jurídico em relação ao autismo e plano de saúde? Fale com um especialista na área!
Se você está sofrendo com uma das situações que mencionamos no decorrer deste conteúdo, busque o apoio de um advogado especialista em planos de saúde.
Após analisar o seu caso em específico, o profissional adequado poderá auxiliar nas reclamações junto aos órgãos reguladores e, se for necessário, o próximo passo será uma ação judicial com pedido liminar para o tratamento.
Esses casos são tratados como prioridade pelo Poder Judiciário, por se tratarem de ações urgentes e que não podem esperar.